Esta exposição é fruto que traz consigo a semente, a memória, a possibilidade presente em todo ser… É fruto de um movimento de apoio, solidariedade e de reconhecimento da importância do Assentamento Terra Prometida do MST – Movimento Sem Terra, instituído nas fronteiras das áreas rurais dos municípios de Duque de Caxias e de Nova Iguaçu. O MVSB – Museu Vivo do São Bento e o CEDAC – Centro de Ação Comunitária empreenderam uma parceria com o Assentamento Terra Prometida para ajudar a contar as histórias das famílias assentadas neste solo considerado por eles sagrado, situado nas margens do Rio Iguaçu. Este assentamento recebeu também o reconhecimento de redes de agroecologia fluminense por contribuir com o abastecimento de alimentos orgânicos saudáveis nas feiras da Baixada Fluminense e do Rio de Janeiro.
O território que acolheu o assentamento Terra Prometida foi palco de múltiplas resistências no passado e no presente: foi território indígena dos tupis, sendo identificada a presença de sítios arqueológicos e registros de Aldeamentos ou Taperas na Marambaia e dos Tucanos na Serra do Tinguá, mencionados em documentos de doações de sesmaria; abrigou no século XIX o Quilombo do Amapá e vários agrupamentos de escravos fugitivos no chamado Campo Grande do São Bento. Parte deste território pertenceu a Ordem do São Bento, sendo nele produzido telhas e tijolos em uma olaria, criação de gado e plantações variadas. Todo o território, da serra até a Baía da Guanabara, era conectado através do Rio Iguaçu e de seus afluentes, por onde circulavam pessoas e coisas. Vários portos foram construídos nas margens do Rio Iguaçu, tais como: Porto dos Saveiros, dos Vaqueiros, da Cebola, da Cruz, dos Ferreiros e o Cais de Iguassu. No século XX, a Ordem do São Bento hipotecou a Fazenda do Iguaçu e as suas terras tornaram -se terras da União. Assim, este território abrigou a partir dos anos de 1930, os Núcleos Coloniais do São Bento e o do Tinguá para assegurar o abastecimento de alimentos para a capital federal. Vários colonos nacionais e estrangeiros, inclusive japoneses, foram assentados nos territórios do atual Amapá, Tabuleiro, Marambaia, Piranema, São Lourenço, Capivari etc.
Em 1942, o governo federal desapropriou quatro fazendas para favorecer a construção da Fábrica Nacional de Motores. Vários camponeses foram sendo assentados como arrendatários e muitos outros foram chegando em busca de terra e de trabalho. Nos anos de 1950 e 1960, todo esse território rural dos municípios de Duque de Caxias e de Nova Iguaçu começou a sofrer com a presença de grileiros disputando as áreas campesinas. Intensos conflitos fundiários foram travados até o golpe militar de 1964. Após a instalação do Ato Institucional Número Cinco, um grupo de resistência armada se institui na Fazenda São Lourenço. Repressão, tortura, morte e desaparecimento atingiram inúmeros militantes.
Em 1980, os lavradores resistiram às novas ações de grileiros. Um núcleo de resistência criou o Núcleo Agrícola Fluminense e as lutas pela reforma agrária continuaram. O Sindicato dos Trabalhadores Rurais instalado no Capivari e que estava sob intervenção dos conservadores e militares, foi retomado pelo movimento. Nesse período surgiu a PET – Pastoral Ecumênica da Terra.
No tempo mais recente e no presente, parte deste território tornou-se território do Assentamento Terra Prometida do MST. A história do assentamento se fez entrelaçada à história das várias famílias sem terra e sem trabalho que encontraram esperança nos acampamentos provisórios ou nos assentamentos instituídos a partir da luta em defesa da reforma agrária. Ao ouvir as histórias de cada um dos assentados, escutamos os clamores em defesa da vida e da dignidade humana, movimentos das mãos daqueles que compartilharam condições materiais similares e o desejo de forjar na terra a promessa de futuro. Um lugar prometido para o trabalho coletivo, familiar e compartilhado.
Vale ressaltar ainda que esta exposição está conectada à exposição Xerém: Lugar de Memória, História, Trabalho e Fé, construída em 2008. Nela, a luta camponesa e a experiência da PET foram visibilizadas e agora são recontadas nesta exposição.
Assim, a exposição “Nas margens do Rio Iguaçu, uma terra prometida” convida o visitante a seguir as pegadas dos trabalhadores rurais que lutaram e lutam ainda hoje para inventar um outro tempo. Eles caminharam para afagar a terra e com o seu trabalho manter o pão na mesa. Natureza Viva que ganhou cor, sabor e existência, apesar das intempéries. É preciso partilhar para não esquecer, para afirmar e alimentar os corpos e a caminhada por essa terra prometida, nas margens de um rio.
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FICHA TÉCNICA
Curadoria: Marlucia Santos de Souza.
Textos: Marlucia Santos de Souza.
Revisão de textos: Flavia Andreia Paes Leite e Risonete Martiniano de Nogueira.
Pesquisa: Filipo da Silva Tardim, Marcos Albuquerque, Marlucia Santos de Souza, Risonete Martiniano de Nogueira, Rosa Maria Cordeiro Alvarenga e Rosenilda Santos da Silva.
Design gráfico: Leear Martiniano.